terça-feira, fevereiro 17, 2009

Como nascem os atacadores púrpura

Já me lembrei muitas vezes de muitos pormenores, que passeiam livremente, e diariamente, pelo meu subconsciente. Dizem os entendidos que o nosso cérebro memoriza cada instante captado pelo nosso olhar, mas que o guarda no nosso subconsciente, para que o consciente não entre em sobrecarga, e nos aconteça o que vulgarmente se apelida de "virar a boneca", "passar-se para o outro lado", "dar-lhe a travadinha" .
Tudo isto serve para me relembrar de uns atacadores púrpura que vi no outro dia. Viviam nos pés de um habitante vestido de preto, cuja diferença residia apenas nos atacadores púrpura que as suas sapatilhas usavam.
Esses pés tinham possivelmente 20 anos, se calhar nem tanto, a avaliar pelas borbulhas que habitavam o tom lívido de uma face adornada de uns óculos, quase tão transparentes, como a sua própria existência.
Olhava para mim e o seu estado de alma não sei que côr teria, mas parece-me que os atacadores eram a unica cor que timidamente habitava aquele espírito, ou não fosse a côr púrpura a dita cor, daqueles que mais evoluídos são espiritualmente.
Na minha opinião o púrpura é apenas uma cor envergonhada, quase tanto como a do habitante das sapatilhas, emolduradas por uns atacadores que, com ou sem vergonha não se importavam de lhe apertar os pés.
O púrpura é a indecisão cromática de um azul pacifista e de um vermelho apaixonado. O púrpura é uma paixão refreada pela paz azul, de um vermelho que não se quer envolver muito.
A paixão roxa nasceu do vermelho apaixonado e da paz do azul pacífico e distraído, e transformou-se em atacadores...que atacam as sapatilhas mais tímidas, negras e as almas transparentes, ocupadas por insconscientes que captam tudo, até ao momento em que deixam de olhar para mim, e olham para as sapatilhas...já desatadas

segunda-feira, fevereiro 16, 2009

domingo, fevereiro 15, 2009

Hoje ...devagar

Hoje há mais um bocadinho de mim que morre, mas aquela morte tranquila, que vem devagar, que nos avisa, que nos faz pensar que a cada dia que passa há mais uma luz que se apaga.

Hoje, no dia que chamei por ti a última vez, a minha voz já pareceu não conseguir gritar com tanta força, há palavras que fazem doer os ouvidos e a garganta...mas piores são as que fazem doer a alma.


Já calcei e descalcei os sapatos uma e outra vez, já me levantei de noite muitas vezes para me ir embora, mas ainda não tive coragem, não sei porquê...
Será que é o amor que nos apega à inexactidão de sentimentos. Será que quando amamos a nossa razão fica de tal modo entorpecida que não somos capazes de dar mais um passo, sem que o coração doa...naquela dor insuportável, que nos faz faltar o ar, que nos prende os movimentos, que não nos deixa ouvir...e que nos faz chorar quando nos fazem sentir a loucura que não temos dentro de nós...apenas uma dor...muito aguda...que aleija sempre no mesmo sítio.

Ode às mulheres da minha vida


São muitas, algumas já nem me lembro do nome. As minhas antepassadas perdem-se na linha do tempo e por isso lhes peço desculpa. Beatriz, Ema, Maria, Carolina, Catarina, Joaquina,Piedade...algumas que me lembro, ainda trocámos olheres confidências, ou pelo menos ouvi algumas das suas histórias. Corre em todas elas o sangue lusitano, oriundo de Lisboa, Ribatejo, Minho, Raia de Espanha, e até galego...este aqui mais antigo e ibérico.
Venderam fruta, fizeram contrabando de café, choraram com um filho morto nos braços, entre as águas do rio Minho, nessa altura era proibido comprar café e vendê-lo fora de fronteira. Deixaram os filhos com outros filhos, e viajaram pelas terras com os maridos, vendiam peles e castanha e feijão, e com olhos azuis e verdes, e cabelos negros e ruivos morreram por amor (...se calhar também mataram...de desgosto).
Não casaram, foram mães de filhos de pais que não o queriam ser, casaram por amor e sem ele, casaram para fugir ao trabalho do campo e cuidaram das quintas, da terra, da vinha...até roubaram um marido a Deus, que não resistiu a uma pele branca e cabelos cor de cobre.
Esguias, altas, mas também morenas e roliças, todas elas são exemplos de valentia e prova disso é a mãe, a minha, que por vontade do destino se dedica hoje às artes, para contrariar um desejo que viu impedido quando era ainda miúda.
Aprenderam a costurar, bordar, coser e cerzir, a cozinhar e a cuidar deles, mas vestiram calças, andaram com juntas de bois, arregaçaram as mangas e disseram que não muitas vezes (outras houve...que disseram que sim). Graças a todas e a cada uma delas sou a mulher que sou, e graças a um gene forte ergo a cabeça e orgulho-me em ser mulher.
Choraram, perderam filhos, ou tiraram-nos simplesmente para não faltar mais pão às bocas que já tinham de alimentar. Usaram saia comprida, corpete e mini-saia, mas foram sempre senhoras. Lutaram e lutam ainda hoje por sonhos, passam a mensagem de que a vida é uma passagem, um pequeno legado que vamos deixar, de gene em gene, de sorriso em sorriso, de lágrima em lágrima.
Choraram, sim, muitas vezes, de alegria e outras de tristeza, muitas em silêncio, e outras em solidão, mas sempre acalentando a esperança que o dia depois de amanhã vai ser melhor, com mais um pão para comer, um filho para criar, um companheiro para manter, mas sobretudo para encher de força cada uma das gerações, com o legado do nome que um dia abdicaram por amor.
Duarte, Vasconcelos, Lourenço e Paixão, são alguns dos nomes que deixaram para trás, mas que eu carrego ainda e sempre no meu sangue! Obrigada mães, sem vocês não seria a mulher em que hoje me tornei, e por todas vós hei-de ser...um pouco mais.