No meio da correria a caminho do trabalho ou das compras compulsivas, a multidão passava desatenta à mão que se estendia numa estação de metro de Lisboa, que serve de passagem a uma dessas grandes superfícies comerciais.
Ela tem olhos azuis, e muitas primaveras já lhe passaram pela pele enrugada, cabelo ralo e branco e nas memórias de uma juventude onde só ela sabia o que fazia. "Se soubesse o que eu corria!" Confessou-me. E eu soube... e vi-a com 20 anos a caminhar de vestido cintado, cabelo penteado e um baton vermelho, a sorrir aos piropos dos que passavam por ela na rua..até aposto que usava uns sapatos de salto alto...vermelhos...e cantarolava uma música romântica de um ídolo de brilhantina no cabelo.
Parei. não consegui fugir pelo meio da multidão, quis falar com ela, saber o que tinha para me contar. Cada ruga soletrava-me uma história, mas mais estórias contavam os olhos rasos de lágrimas quando lhe perguntei pela família. Chama-se Maria, como tantas outras, mas tenho a certeza que em nova não ía com qualquer uma. Imagino-a a soltar gargalhadas de sorriso brilhante, agora perdido.
Pergunto por onde caminhamos, como passamos todos os dias ausentes da realidade e da solidão em que vivemos todos os dias (e fazemos viver) mas também me pergunto que família se sente impune ao abandonar uma mãe ou uma avó, ao frio de um Inverno, na solidão da velhice, numa viuvez de principios.
Quando me confessou fome, quis abraçá-la e protegê-la, como se protege um garoto que chora perdido a chamar pelos pais, mas apenas lhe aqueci uma sopa, que achei tão pouco, quando ela me retribuiu com muito mais, nos desejos de alegria e na felicidade para os meninos, que ainda não tenho.
Ficou só, e eu fiquei ainda mais, quando remoída pelos meus pensamentos e o peso de tê-la deixado tão desamparada, ao confessar que morria todos os dias mais um pouco mais...
Do alto do nosso ego fazemos tão pouco e enchemo-nos de orgulho umbilical, cada vez que nos alienamos e distanciamos mais da realidade isenta de valores de respeito e caridade social.
A velhice é uma segunda infância, e deixar ao abandono alguém tão frágil é mais grave que lhe tirar a vida, é simplesmente roubar-lhe a alegria de fazer mais do que simplesmente sobreviver, ser feliz e viver a velha infância com a dignidade que lhe devia ser oferecida com troféu de entrega a uma vida de tantos anos.
Os idosos são as raízes da sociedade, e cada vez que os ignoramos e passamos ao lado daquele sofrimento alheio, perdemos enquanto seres humanos e faltamos ao respeito aos nossos antepassados, esquecendo-nos que o livro da vida se escreve no tempo...e cada dia a mais se junta ao calendário da velhice que, de mão estendida, espera por nós.
3 comentários:
Dado que estavas a seguir o meu blog, www.destaquesjuvenis.blogspot.com, venho só dizer que esta é a minha nova conta e que este (http://everyoneisontheirown.blogspot.com) é o meu novo blog :)
Espero que gostes!
Um Beijinho, D.
Obrigada :)
Qual delas? estão lá duas...
Beijinho
é da foto com a maçã na barriga
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